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sexta-feira, 19 de abril de 2013

Reportagem Especial - Débora Fiorini


Para dentro dos portões
Nem tudo é concreto no novo centro de São Paulo. Em plena Avenida Paulista, o Parque Trianon é considerado um pequeno refúgio verde para aqueles que estão cansados da cidade cinza.
Por Débora Fiorini




Andando pela Avenida Paulista, o auxiliar administrativo André Santos é mais um na multidão. Anda depressa como todos os outros, pois tem horários a cumprir. Apesar da rápida caminhada entre as pessoas, o rosto de André exibe uma aparência de cansaço. E é isso que ele sente praticamente todos os dias, pois a rotina na cidade é tão frenética que não há tempo para pausas. Assim, a exaustão se torna cotidiana.
Há cinco meses, André decidiu que reservaria um tempo de seu agitado dia de trabalho para descansar e se refugiar, nem que fosse por 15 minutos, da cidade que o cerca. O único problema era: aonde? E ele encontrou esse local na mesma alvoroçada Avenida onde trabalha; o Parque Trianon.
Nomeado como Parque Tenente Siqueira Campos, porém mais conhecido como Parque Trianon, este é um dos locais de São Paulo que surpreendem. A cidade é uma grande “selva de pedra” e por mais clichê que essa expressão seja, ela continua sendo verdade. Assim, os poucos espaços verdes que São Paulo abriga são extremamente valorizados; e o Parque é um deles. Possui mais de 48 mil metros quadrados de área, recheados de muitas árvores. Essas, inclusive, são espécies nativas da região, identificadas por placas com seus nomes populares e científicos. Lá é possível ver a Sapucaia, a Chichá, o Jequitibá-branco e diversos outros tipos de árvores. Como são antigas, essas espécies já cresceram e os troncos estão muito altos, podendo então fazer sombra em todo o Parque e proporcionar um ambiente fresco.
Além de árvores, o Parque Trianon abriga espécies animais. O sub-bosque, como é chamada a área natural, tem um ambiente favorável para o desenvolvimento de pequenos habitats de insetos, aves e pequenos roedores, principalmente. O João-de-barro e o Bem-te-vi são apenas algumas das aves que podem ser admiradas em uma passagem pelo lugar. O ambiente que surge é de um espaço completamente diferente da grande cidade, onde os sons de buzinas ficam quase imperceptíveis e são substituídos por cantos de pássaros.
Porém, engana-se quem pensa que o Parque Trianon só é feito de espaços naturais. Ele possui um percurso para caminhada e corrida de 900 metros, com demarcações. Com amplas “ruas”, o local permite que várias pessoas transitem sem grandes problemas, tanto quem está visitando, como quem está praticando esportes. Além disso, há dois parquinhos de areia para as crianças brincarem, com brinquedos de madeira. Há uma grande fonte, banheiros, mural de avisos, caixa de sugestões, placas de informação, local para coleta de óleo, pilhas, baterias e chapas de raio-x, aparelhos de ginástica e esculturas artísticas em todo o trajeto. O Parque tem horário para abrir e fechar, vigias e funcionários de limpeza que dão manutenção ao local.
Para muitos visitantes, o Parque encanta exatamente por conter vários elementos em um só lugar. As esculturas são um diferencial. Na entrada principal do Parque Trianon, localizada na Avenida Paulista, há uma grande escultura do Bandeirante Bartolomeu Bueno da Silva, o “Anhanguera”, que significa “diabo velho”. Esse “apelido” foi dado pelos índios, que foram caçados pelos bandeirantes do século XVI ao XVIII na região do Estado de São Paulo.  Dentro do Parque, há uma interessante escultura denominada “Fauno” e outra do busto de Joaquim Eugenio de Lima, idealizador e realizador da Avenida Paulista; entre outras obras de arte.
Durante uma caminhada pelo Parque, não se assuste se encontrar grandes teias e aranhas entre as árvores. São da espécie Nephila clavipe, comuns na Mata Atlântica e com veneno inofensivo para os seres humanos. Esse aviso está no mural do Parque, já que não é raro ver muitos visitantes impressionados e preocupados ao se depararem com as aranhas. São todos esses pequenos detalhes que fazem do local um ambiente, no mínimo, interessante. E esse exótico lugar na cidade grande não foi feito recentemente.
O Parque Trianon foi inaugurado em 1892, um ano depois da abertura da Avenida Paulista. Foi projetado pelo paisagista francês Paul Villon, este que também participou de outros projetos paisagísticos no Brasil. A ideia surgiu na época em que se procurava urbanizar a cidade de São Paulo nos modelos de cidades europeias, com grandes jardins. Por muito tempo o ambiente serviu de espaço para a visitação e festas da alta sociedade que habitava aquela região nos grandes casarões. Em 1924, o Parque foi doado à Prefeitura pela iniciativa privada e, recentemente, foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT). O nome “Tenente Siqueira Campos” é uma homenagem ao participante da Revolta Tenentista e o popular nome “Trianon” faz referência a um extinto clube chamado Trianon e que ficava em frente ao Parque, do outro lado da Avenida, onde hoje é o Museu de Arte De São Paulo (MASP).
Apesar de tantas características surpreendentes em um ambiente exótico da cidade grande, há ainda algo que impressiona mais. Não são objetos, estruturas ou vegetação. São as pessoas que frequentam o Parque Trianon e, principalmente, o que fazem lá dentro. Durante a parte da manhã, é muito comum ver o ambiente sendo utilizado para a prática de esportes. Danilo Corrêa, de 28 anos, morador da região, acorda todo dia às 7 horas da manhã para correr no Parque. Assim como ele, há muitos outros. Há os que correm e os que caminham, e aqueles que levam os cachorros para passear. Pode-se dizer que a manhã do Parque é bem agitada. Há pessoas, como Danilo, que religiosamente vão todos os dias correr no local e outras que variam. E são pessoas de todas as idades. Há uma grande maioria da 3ª idade que utiliza os equipamentos de ginástica e não se cansam dos 900 metros de percurso para correr e caminhar. Há também um grande grupo de senhoras e senhores que, sob orientações de um professor, praticam exercícios terapêuticos chineses, com movimentos leves e embalados por músicas calmas e relaxantes.
Durante o horário da tarde, o clima é de descanso. Quase não se vê a prática de exercícios físicos. A grande maioria de visitantes são como André, aquele do começo da reportagem; trabalhadores que aproveitam o pouco tempo de almoço para dar uma parada no Parque e descansar o corpo e a mente. É durante esse período que várias cenas curiosas são vistas. Há um intenso clima de romance no ar e muitos casais se aconchegam nos bancos para namorarem. Há também os que escolhem ficar sozinhos, apenas olhando para o parque, com o pensamento longe. Novamente é o caso de André Santos, que prefere se afastar dos grupos falantes e dedicar um tempo para ele mesmo, tentando pensar em apenas momentos bons.
Outras pessoas se reúnem em grupo para conversar e outros sentam e leem livros como o best-seller “50 tons de Cinza”, da autora E. L. James ou o clássico “Dom Casmurro” de Machado de Assis. Há também os que desenham e os que aproveitam os bancos para tirar um cochilo. Independente das atividades, o Parque é usado principalmente como refúgio. A estudante Ellen Florêncio, de 20 anos, mudou-se de Taubaté (interior de SP) para São Paulo em 2011. Desde então, ela usa o Parque Trianon como atalho para chegar à faculdade onde estuda. E ao passar todos os dias pelo local, ela sente um pouco da calmaria que tinha no interior. Segundo Ellen “o Parque é como um refúgio em uma selva de pedra que é a cidade. Eu gosto de usá-lo como atalho logo pela manhã, pra sentir um pouco de ar fresco e ver uma cena que eu não vou encontrar no resto da cidade”. O ambiente verde proporciona lembranças da cidade interiorana e para quem acaba de chegar a São Paulo, o Parque funciona como uma escapatória da nova realidade.
A grande maioria de frequentadores do local pode dizer a mesmo que Ellen disse. Quando questionados, os visitantes indicam o Parque como uma grande área de descanso. Pensam nos problemas da vida, banalidades do cotidiano ou em sonhos que ainda querem realizar. Maria do Carmo, de 59 anos, funcionária de limpeza de um dos prédios da redondeza, gosta de ir ao Trianon para refletir um pouco sobre a sua vida, o que a preocupa, como a educação dos filhos, e o que ela sonha em fazer. “Quero fazer uma viagem para a Itália com toda a minha família. Eu fico sentada no banco imaginando como seria e fazendo planos.”.
Outras cenas também chamam a atenção dos visitantes mais observadores do Parque. Há muitos executivos no lugar, que trabalham nos prédios da Avenida Paulista. Há estudantes e há moradores de rua. Esse equilíbrio de frequentadores torna o ambiente mais exótico ainda. Enquanto um diretor de empresa está com seu ipad conferindo notícias do dia, senta no banco ao lado dele um morador de rua, carregado de revistas e jornais e que, com um olhar fundo, lê e observa todos os textos e imagens que tem nas mãos. O cenário também dá espaço para situações curiosas. Maria do Carmo conta que, “um dia vi um moço depilando a perna com gilete, aqui no Parque. No meio de todo mundo. Ele cheirava mal, devia ser mendigo. Mas foi engraçado ver aquilo”.
Ler, conversar, refletir, dormir... O Parque Tenente Siqueira Campos é usado para várias atividades. A palavra que mais o identifica é “refúgio”, tanto para os próprios paulistanos, como para os que não são da cidade. O Parque se tornou um dos poucos locais da grande São Paulo que abrigam um lugar verde, com ar fresco e um pouco de silêncio para dar uma pausa no dia-a-dia. Para dentro dos portões, povoado de personagens comuns e exóticos, o Parque Trianon se caracteriza por ser um ambiente harmonioso.

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