E agora, aonde vamos?
Por Gabriel Fabri
Nos
últimos dez anos, o Brasil viu uma notável mudança na agenda política do país a
partir da posse de um metalúrgico como Presidente. Inverteu-se a prioridade do
governo, agora voltada a políticas sociais que visam atenuar a alarmante
desigualdade social e todos os problemas relacionados a ela – a educação, a
saúde e, principalmente, a miséria. A lógica neoliberal de Estado Mínimo é aos
poucos sendo amenizada por uma nova forma de governar, que propõe intervenção
do Estado para garantir o crescimento, com distribuição de renda. Com isso,
grandes mudanças foram conquistadas, mas ainda há muito a ser feito. Quais
devem ser os caminhos a se percorrer para o Brasil continuar crescendo,
aproveitando o bom momento em que o país se encontra? Quais temas devem ser
discutidos e pautados pela sociedade e os meios de comunicação?
O ex-presidente do PT e deputado
federal, José Genoino, acredita que o Bolsa Família deve ser consolidado. “Eu
acho que contra a miséria absoluta, a exclusão, é uma luta permanente”, afirma.
Para ele, o programa “deve avançar”, pois “não basta tirar as pessoas da
pobreza extrema e da situação de penúria social, têm que elevar o padrão,
porque nosso objetivo é universalizar direitos sociais”. O Bolsa Família, em
sua opinião, é o símbolo da inclusão social e a política pública essencial dos
governos petistas, que, atrelada a outras como o “Minha Casa, Minha Vida” e a
de salário mínimo, por exemplo, contribuem para diminuir a desigualdade social,
“uma marca histórica desde que a gente existe como país e sociedade”.
“Nós temos muitos problemas ainda para
resolver, pois temos um déficit social muito grande, mas o Brasil avançou”,
afirma o deputado. De fato, a pobreza extrema está perto de ser erradicada, o
salário mínimo aumentou e a situação é quase de pleno emprego, com taxa de
desocupação que chega a 5,5% em 2013 (a taxa média dos dez anos foi de 7,28%,
contra 9,26% dos governos FHC – em dezembro de 2012, o índice atingiu 4,4%). O
acesso às universidades, com programas como o ProUni e a política de cotas,
cresceu. As reservas internacionais e o PIB per capita foram elevados
consideravelmente em relação ao período FHC, assim como a inflação anual variou
menos. Enquanto a Europa afunda na crise neoliberal, o Brasil vive seu melhor
momento. Para Genoino, está na hora de dar mais “oportunidades, emprego e
acesso a políticas públicas” para áreas de suma importância como saúde e
educação.
Questionado sobre as políticas de
distribuição de renda, o comentarista da TV Gazeta e jornalista, Bob Fernandes,
afirma que não vê problemas em sua continuidade, até quando for necessário. “O
Brasil já deveria ter percebido que só não quebrou com a crise mundial de 2008
porque o chamado Bolsa Família, articulado com outros mecanismos, permitiu que
o dinheiro corresse nas camadas mais baixas da sociedade”, explica. E ainda faz
uma provocação, em referência à uma obra do sociólogo Gilberto Freyre: “só não
quer o Bolsa Família quem acredita
na perpetuação da Casa Grande e da Senzala”.
Fernandes considera “importantíssimas,
do ponto de vista social” as políticas públicas implantadas “desde o começo do
governo Lula”. Entretanto, o maior avanço seria “no imaginário das pessoas”,
pois grande parte delas “se
convenceram que tem direito à dignidade”. “Eu diria que as pessoas estão saindo
da Senzala, estão percebendo que tem direito à vida e direito a lutar pelas
coisas” - se antes o país era governado “para 20 milhões de habitantes”, agora
que isso mudou, a infraestrutura passa a ser “um desafio gigantesco”, pois há
uma série de defasagens nos serviços para grande quantidade de pessoas, como
transporte público e aeroportos, por exemplo.
Para Toninho Vespoli, vereador de São
Paulo pelo PSOL, o Brasil tem que focar em políticas para a saúde, a educação,
o trabalho e a terra. Entretanto, a questão prioritária seria em torno da
dívida pública. Ele afirma que “nunca na história rescente conseguimos um saldo
no Brasil que desse pra pagar a dívida externa, isso é verdade”, mas que “boa
parte dos empresários das grandes corporações transformam a divida externa em
interna”. Ele explica: como a taxa básica de juros (Selic) é muito alta, estrangeiros
acabam investindo em títulos da dívida interna, lucrando mais com os juros.
Embora Dilma tenha conseguido abaixar a taxa para o menor valor da história do
país, 7,25% no final de 2012 (em 1997, o índice chegou a atingir 45,67%),
Toninho considera essencial discutir sobre o tema, pois acredita que “se deixa
de investir para pagar juros”.
O vereador também comentou um pouco
sobre as políticas de distribuição de renda dos últimos dez anos: “elas tem um
valor excepcional, porque está respondendo a uma necessidade veemente do povo,
mas não pode parar por ai”. Ele afirma também que “daqui em diante, o governo
não ai encontrar flores”, com relação ao crescimento social, pois “chegou ao
seu limite, por optar crescer dentro do capitalismo”. .
Reforma
Política
Os três entrevistados
demonstraram apoio à realização de uma reforma política. Para o deputado
Genoino, um avanço nesse tema foi o que mais fez falta nos últimos dez anos,
junto com a “democratização do acesso à informação”. Ele aponta para um “um déficit social e uma crise politica
muito grandes, por falta de uma reforma”.
Genoino considera importante que a
medida “limite o desgaste de campanha, garanta o seu financiamento público,
fortaleça os partidos e aproxime o eleito do eleitor”. Para trazer para perto a sociedade das instituições, acredita
que se deva “diminuir as exigências para plebiscito, participação popular e
referendo”. A medida seria significativa “para enfrentar problemas
estruturais”, conclui. Toninho Vespoli também ressaltou a necessidade de
“mecanismos mais diretos”.
Bob Fernandes ressalta a reforma
política como “o maior desafio” para os próximos anos. Ele considera o sistema
político e partidário inadequado, por conta do grande número de partidos, dos
problemas decorrentes de conseguir a chamada governabilidade e “de ter que
ceder a chantagens dessa forma que ocorre”. Aponta “distorções das mais
variadas nesse jogo de toma lá da cá, toma lá da cá”, com “todos os presidentes
da redemocratização até agora, de Sarney até Dilma”, enfrentando os mesmos
problemas. Entre essas distorções, está o exemplo à respeito do polêmico Marco
Feliciano: “evidente que um partido como o PSC com meia dúzia de eleitores
proporcionalmente não pode dirigir uma comissão de direitos humanos’’.
O jornalista aprofunda o debate sobre
as campanhas eleitorais. “Cada governo fará uma CPI do governo anterior, e, por
sua vez, será cpizado pelo seguinte”, pois é “do sistema”, sendo preciso
“fazer grana para fazer campanha”. Também indaga: “por que não fazer debates,
botar as pessoas para discutir, ao invés de fazer programas com um céu lindo,
passarinhos voando e plantas sorrindo?”.
Em abril de 2013, fracassou a tentativa
do deputado Henrique Fontana (PT-RS) de aprovar a medida, que está sendo
debatida há dois anos. Questionado sobre a possibilidade de uma reforma vir a
ser aprovada (não especificamente o projeto de Fontana), Bob Fernandes foi
enfático: “nem fuzilando!”.
Ele explica: “com esses congressos como
são, só se tiver com uma crise institucional avassaladora, o que é ruim, porque
uma reforma com crise é sempre ruim. Ou se chegar a um consenso de que você
deve ter uma constituinte exclusiva para discutir e tratar da reforma política,
proposta e eleita, que não tenha a ver com o congresso”.
Vespoli também não é muito esperançoso
com a aprovação de uma reforma política em curto prazo. “Nem essa reforma política mais branda
que rola no congresso deve sair, porque os interesses ai são muitos”, afirma.
“Há anos que falamos isso, e quando sai, sai um remendinho só”. O projeto do PT
a que o vereador se refere prevê “o financiamento público exclusivo de campanha
eleitorais, o voto em lista para deputados e vereadores e o fim das coligações
nas eleições proporcionais”, segundo o site da Rede Brasil Atual.
Genoino vê a viabilização da reforma
com outros olhos. “você não pode definir se uma coisa vai acontecer ou
não, é a luta. É a mobilização que vai garantir, a repercussão que vai produzir
essas
soluções políticas”. No dia 13 de abril, o PT
começou a coletar assinaturas para apresentar um projeto popular sobre o
assunto, e já tem preparado material de campanha preparado por João Santana, o
responsável pelo marketing da reeleição de Lula em 2006, da eleição de
Dilma Rousseff em 2010 e de Fernando Haddad em 2012.
Regulação
da Mídia
Genoino destacou outro desafio
para os próximos anos - a regulação da mídia. Entretanto, diante das
acusações de que essa medida seria censura, tanto o político como Bob Fernandes
refutaram atribuir esse nome à necessidade de aprovar um novo marco regulatório
para as comunicações.
“Eu nem falo em regulação da
mídia, falo em democratizar o acesso à informação”, afirma o deputado. “Não
significa controlar nada, e sim facilitar o acesso. A informação é um direito
do cidadão e um bem público e nós temos que lutar para diminuir o monopólio
privado do acesso à informação”, explica.
Bob foi mais direto: “não sou
idiota, sou jornalista, não quero controle”. O que ele diz ser necessário é
“regulamentação da indústria da comunicação”, presente em “todos os países
importantes do mundo civilizado”. Isso significa “não permitir que determinados
grupos tenha um poder avassalador”, poder com o qual, do ponto de vista
capitalista, não é possível concorrer. “Quem disse que isso é censura evidentemente
não quer perder privilégios”, provoca. “Um terço do congresso ou a metade
dele pode ser dono de meios de comunicação - é ou não é uma vantagem? Onde está
o democrático nessa história?” - em todos os seus 34 anos como jornalista,
todos os casos de censura que viu desde a redemocratização foram os de censura
interna, “feita pelos donos dos meios de comunicação”, então, ele questiona,
”isso é a censura cotidiana. Por que não discutem isso?”.
Para o vereador, a regulação da
mídia é “muito importante”. Ele afirma que “países do capitalismo central, como
Estados Unidos e Alemanha”, possuem leis que regulam o monopólio das
comunicações. Aqui no Brasil, existe o problema da “concentração muito grande
nas mãos de poucos”, gerando um “pensamento único” (pautas semelhantes em todas
as empresas) que chamou de “lavagem cerebral”. Ele critica a grande mídia, que
“trabalha muito em cima do lucro e do sensacionalismo”. Deve-se debater também
“qual o compromisso desses meios com a sociedade”.
Ele considera que o governo Lula “errou
frontalmente” na questão da mídia, renovando as concessões, sem debate com a
sociedade. E acha que a medida não vai sair do papel, apesar de ser uma das
pautas prioritárias do partido. Tentando agradar um pouquinho a todos, “governo
do PT é o governo do paz e amor, de não gerir conflitos na sociedade. Ele não
quer briga”, afirma. Portanto, não acredita que o marco regulatório saia à
curto prazo.
Próximos
Passos
O debate sobre os dois temas aqui
propostos e os próximos rumos do Brasil promete continuar sendo quente. A
regulação da indústria da comunicação e a reforma política, mesmo que pareçam
ser propostas muito difíceis de consolidadas, devem ser pautadas, pois,
evidentemente, precisam de respaldo popular. Em 2013, o PT pretende ir às ruas
buscar assinaturas para o projeto de reforma política, enquanto discute-se um
projeto de iniciativa popular para o outro tema, partindo da campanha Para
Expressar A Liberdade, da FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da
Comunicação). Se, para os três entrevistados, a aprovação dessas medidas é de
grande importância, talvez esteja mais do que na hora de aprofundar o debate e
convidar mais pessoas a conhecer e discutir esses temas.
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