Pedagogia Waldorf: a arte pode ser a solução
Já
imaginou uma escola sem provas? Aprender gastronomia e astrologia no fundamental?
E ainda construir a maquete de uma casa aos oito anos? Apresentada pela UNESCO
como a solução para o mundo, capaz de responder aos desafios educacionais, a pedagogia
Waldorf criada por Rudolf Steiner em 1919 têm como principais características o embasamento na concepção de desenvolvimento
do ser humano, as características das crianças são consideradas e não há nenhum
modo de pressão. Os alunos não são sobrecarregados, mas desafiados.
Afastadas das áreas centrais da cidade de São Paulo, com
cheiro de casa de avó e quintal para brincar, as escolas Waldorf fazem do mundo
um lugar melhor para se viver. As crianças são envolvidas por afeto dos
professores que ficam em média oito anos com a mesma classe e por isso aprendem
lidar com as dificuldades individuais dos alunos, passam a conhecê-los o
suficiente para poder escolher a melhor maneira de ensinar a matéria para cada
um.
O universo educacional da pedagogia Waldorf é baseado na
curiosidade das crianças, elas sentem vontade em estudar e tem sede para
descobrir coisas novas. Cada aspecto do currículo, apresentado em cada ano
escolar, é trazido com base no conhecimento de como a vida interior da criança
está se desdobrando naquele momento. Carolina Neumann, professora da Waldorf,
explica que no terceiro ano os alunos constroem uma casa. E existe todo um
significado atrás desse projeto, nessa fase as crianças se sentem inseguras,
tendem a perguntar se são adotadas e têm medo de se perderem dos pais. A
construção de uma casa pode trazer segurança e confortá-las de algum modo.
Todas as fases da criança foram estudadas e cada ano a
matéria varia de acordo com o que o interior da criança sente e precisa. A
infância precisa de imaginação, como Zezé do clássico “Meu Pé de Laranja Lima”,
não precisava de internet, ele tinha uma árvore incrível que brincava com ele o
tempo todo. As estórias que o menino peralta criava não eram compreendidas e
ele apanhava por viver fazendo bagunça, mas na verdade ele só estava exercendo
o papel da criança: criar, rir e brincar. É esse o estímulo da pedagogia Waldorf,
o método incentiva por meio de contos, lendas e mitos exatamente o que a
infância pede: imaginação, fantasias. Por isso, não cabe exigir de uma criança
o pensamento abstrato, intelectual nessa fase. O saber rigorosamente científico
só é solicitado do Ensino Médio (colegial).
E na hora
do vestibular?
Na teoria tudo parece maravilhoso, mas algumas dúvidas surgem
a respeito da entrada dos ex alunos Waldorf no “mundo real”. Como eles lidam
com a pressão do mercado de trabalho? Será que não prejudicados na hora do
vestibular e passados para trás na disputa pelas vagas das melhores
universidades do país? E ainda, se a pedagogia Waldorf preza por um enorme
contato com a arte, os alunos não são, de alguma forma, influenciados a seguir
por uma carreira artística ou humana?
Ingra Ribeiro Garcia, de 19 anos, é ex aluna da Escolas
Waldorf Francisco de Assis e do Colégio Waldorf Micael de São Paulo. Além de
não se sentir prejudicada no vestibular, Ingra comenta que um bom estudante nas
escolas Waldorf consegue ingressar em boas faculdades no curso que escolher.
“Em longo prazo, a metodologia Waldorf ajuda a desenvolver uma maneira de
pensar diferente, isso nos ajuda a lidar com situações de maneira diferente dos
demais, estimula a criatividade”. A estudante de culinária ainda afirma: “A
Waldorf pode ter me influenciado na escolha do curso, tive muitas vivências com
culinária no decorrer dos anos.”
Wanda Ribeiro
(socióloga) e Juan Pablo de Jesus Pereira (engenheiro civil e empresário)
desenvolveram uma pesquisa que investiga e relata a trajetória de vida de
ex-alunos Waldorf. Foram entrevistados 135 pessoas e a conclusão desvenda sete
mitos que envolvem a pedagogia Waldorf:
1.
“Os ex-alunos têm muita
dificuldade em passar no vestibular”, 100% dos que
prestaram vestibular passaram, sendo 91% na primeira tentativa.
2.
“Só passam em vestibular de
faculdades de segunda expressão” 68% entraram em faculdades de primeira
expressão (segundo classificação do "Provão" do MEC).
3.
“Não têm capacidade para
cursar uma faculdade, 92% completaram com êxito o ensino superior.
4.
“A Pedagogia Waldorf só forma
artistas” , Apenas 12% formaram-se em carreiras artísticas.
5.
“A Pedagogia Waldorf não
prepara para o mercado de trabalho, 99% estão atuando no mercado de
trabalho.
6.
A Pedagogia Waldorf não prepara
para o mundo da competição profissional, 84% não se
sentiram prejudicados.
7.
A Pedagogia Waldorf é de
doutrinação religiosa, 100% não perceberam nenhum tipo
de doutrinação religiosa.
A
pesquisa, portanto, esclarece que essa metologia alternativa não fica para trás
na corrida em busca das melhores universidades e em longo prazo parece cumprir
o prometido. Mariana Severo Bonetti, também de 19 anos, ex aluna da
Escola Waldorf Francisco de Assis, acredita que a experiência nessa escola
trouxe auteridade em sua vida. Palavra que define o “olhar o outro com os olhos
do outro. Desejo de se aproximar do outro, tentando sentir como este sente.
Quebra de preconceito”. Mariana cursa administração na faculdade Inper –
Instituto de Ensino e Pesquisa – uma das mais reconhecidas do país nesse curso.
Mariana não acha que foi lesada quando prestou vestibular e acredita que com
cursinho um aluno Waldorf tem sustância para passar em qualquer universidade.
Layssa comenta que a
preocupação com o vestibular foi muito discutida no nono ano, tanto entre os
alunos quanto entre os pais. Por não ter prestado vestibular para faculdades
federais, a estudante sentiu dificuldade na avaliação do tema: “De forma geral,
não acredito que escolas Waldorf deixem a desejar em conteúdo de forma a
prejudicar alguém no vestibular e mesmo que deixe, seria uma defasagem fácil de
resolver com cursos preparatórios que tem essa finalidade, já o desenvolvimento
pessoal adquirido em ano dentro dessa pedagogia não se adquire tão facilmente
assim de outras formas.”
Por que Waldorf?
A
abordagem é artística, mas não deixa de ser rigorosa. Nas escolas Waldorf não
existem comandos: “faça isso”, são apresentados possibilidades a ser seguidas.
Nunca é mostrado apenas um ponto de vista. Dessa forma, as crianças se tornam
criativas e são incentivadas a pensarem alem do padrão, no futuro poderão criar
novas formas, novas possibilidades.
“A maior diferença consiste no modo que você enxerga o
mundo e as coisas ao seu redor: como resultado de suas ações, e não como algo
que simplesmente “nasceu” daquela maneira, você compreende o processo das
coisas. Além disso, os alunos ficam muito próximos de seus professores,
colegas, pais e pais dos colegas, o que cria um vinculo extremamente forte”,
disse Mariana Bonetti.
De toda a
experiência, a ex estudante só não gostou da pressão dos amigos e familiares
que não confiavam no método da escola e tinham medo de que não a preparassem
para a vida. “Hoje percebo que não esqueço das coisas que aprendi na escola, e
aprendi de uma maneira muito melhor do que “decorar pra prova”, completou.
Comparando a metodologia alternativa com as tradicionais,
Ingra afirma: “A escola Waldorf acompanha o ritmo natural de amadurecimento e
aprendizagem do ser humano, possui muitas aulas de artes (pintura, desenho,
argila, música, coral ... ), ela procura formar o indivíduo para atuar no
mundo, formá-lo enquanto ser humano e não apenas mais um vestibulando”. A
estudante elogia a pedagogia por não tê-la forçado a aprender muito conteúdo em
curto tempo e sim absorvê-lo aos poucos e também estima o contato com a arte.
Em longo prazo, se vê mais humanizada do que as pessoas ao seu redor.
Layssa
Pascher, cursa Rádio e TV na faculdade Cásper Líbero e conta que por ter saído
de um colégio tradicional, teve dificuldade de se adaptar a metodologia Waldorf
no início. Mas comenta que se deu muito bem com a pedagogia ao longo de sua
experiência na Waldorf.
A estudante não se
arrepende de ter estudado na Waldorf São Paulo e comenta que essa metodologia
alternativa vale a pena, hoje preza seus aprendizados artísticos: “Lá eu tive o
primeiro contato de verdade com meu lado artístico e desenvolvi muitas
habilidades que nem sabia que tinha. Acho que esses três anos que estudei em
escola waldorf foram muito refletiram muito na pessoa que eu me tornei, mesmo
tendo passado pouco tempo lá”.
As crianças se sentem
em casa, as escolas Waldorf são aconchegantes e fazem do momento de aprendizado
uma brincadeira gostosa. Na Waldorf São Paulo, fisicamente a escola é pequena, mas
atende a todas às necessidades. Tem quadra, biblioteca, salão, cantina, sala de
marcenaria e laboratórios. Layssa adorou a experiência: “O que eu mais gostei
de lá foi ter entrado em contato com um mundo que até então eu não conhecia,
tanto através das aulas de música, dança, artes manuais e desenho, quanto pela
ênfase que tinham as matérias tradicionais, também lecionadas de forma
diferente em comparação aos outros colégios onde eu havia estudado”, afirmou.
Além de todas essas
características, a metologia de Steiner avalia cada aluno particularmente. Layssa
conta que recebia, no fim de cada ano, um texto da professora que acompanhava a
classe sobre o seu desempenho, pontos bons e pontos a melhorar, características
pessoais. A avaliação comparava o aluno a ele mesmo, estimulando-o a crescer e
ser a melhor versão de si mesmo.
E no futuro?
Ouvimos muito a
pergunta “que esporte você pratica?”, mas raramente as pessoas perguntam qual é
nosso hobby artístico. São tantas
coisas para estudar e se profissionalizar para o mercado de trabalho que,
atualmente, as pessoas não sabem mais pregar um botão em uma camisa. Nos ônibus
e metro, um empurra-empurra. Nas placas escrito: “Dê passagem para as pessoas
saírem do metro”. Para atravessar a rua na faixa de pedestre ficamos aflitos,
os carros não nos dão passagem. Criar objetos de madeira parece impossível. As
compras não têm mais fim, estragou jogamos fora, nossas habilidades artísticas
estão escondidas. Uma calça de marca vale mais, mesmo sendo de um tecido igual
às outras.
Não que seja
definitivo, mas certamente ex alunos da pedagogia Waldorf tendem a ser mais
humanizados. Aprendem o valor da vida e passam anos cercados em uma política
afetiva. Desenvolvem o amor pelo outro e sabem compreendê-lo. Aprendem tricô,
crochê e muito mais. Para que jogar fora se posso consertar? Criam objetos de
sua necessidade, sabem cozinhar e explicar muitas constelações estrelar.
A arte pode ser
a solução. Desde o nosso nascimento, buscamos o sentido
da vida, essa procura permitiu ao homem que transgredisse de sua condição
animal e instintiva. A arte foi a ferramenta que auxiliou essa transformação. Somos
um ser dual, só a comida não nos basta, precisamos consumir cultura.
Um hobby artístico pode resolver muitos anseios e crise da humanidade.
Síndrome do pânico, distúrbios de alimentação, falta de atenção... Muitos de nossos problemas se dão pela falta
de conexão com nossa própria mente.
Na origem da
humanidade, a arte foi confundida com o conceito de Deus. Ambos traziam a compreensão
do próprio ser e do universo. O medo de não saber os motivos de nossa
existência – quem somos? Para onde vamos? – é amenizado com a arte.
Mesmo que seja
necessário um cursinho para conseguir ingressar em uma faculdade pública de
medicina, a experiência nas escolas Waldorf vale a pena. De que adianta saber
de cor a tabela periódica e não conhecer suas habilidades artísticas? Passar
direto do colegial na melhor universidade do país e passar a vida com distúrbio
de alimentação? E ainda saber tantos conhecimentos científicos e não saber
respeitar o outro?
São as pessoas que
fazem o mundo ser como ele é, se elas forem mais humanizadas e souberem
compreender a situação do outro, realmente o mundo se tornará um lugar melhor
para se viver.
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